21 maio 2007

Não escrever durante estes meses fez ferrugem nos dedos. Sinto-os pesados e como que obrigados a escrever. Há algo em mim que se perdeu. Nada tem o sentido de antes. Aliás nada tem sentido agora. Cântico Negro já não é o meu poema de eleição. Não há nada com que eu me identifique. Seria mais: - "Vem por aqui" -
dizem-me alguns com olhos doces,
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom se eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui"!
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos meus olhos, ironias e cansaços)
E descruzo os braços,
E vejo-me a ir por ali...

Sem explicação aparente, já não remo contra a maré. Não vejo nenhum objectivo. Peçam-me impossíveis e eu os obterei. Nada me preocupa, tudo me enfada. Viver na pressão de mais, mais, mais; atingiu tal ponto que o mais é nada. Não tem significado. Sou uma laranja espremida. Já não sai sumo, nem vitamina que se aproveite. Não me interessa que precisem de mim, não me interessa se eu preciso de alguém. Vazio. O tempo deixou um vazio no lugar das emoções. Uma morte, um nascimento, um desaparecimento, um encontro, um desabafo, uma queixa- seja o que for desvanece perante o meu olhar cansado. Ninguém nota quando as pessoas concordam em tudo. Porém, é isso que se deve estranhar. Um desaparecimento- mundo: "OH!!", porque não "HUM?" ou "e depois?" ou "Acontece.." Insensibilidade? poderá ser. Uma morte ou um nascimento- haverá coisa mais vulgar? Morreu um familiar teu? tenho muita pena, mas não sinto mesmo nada... Morreu um meu? então não preciso de tristezas forçadas, eu cá arranjo as minhas próprias. Tiveste um sobrinho? queres que diga que maravilha? ou que coisa fofa? os bebés são todos iguais, as crianças idem aspas. só te digo cuidado, não te deixes manipular. O bebé é meu? Então guardo-o só para mim. Lá me interessa que aches bonito ou feio, mimado ou inteligente. Só eu sei aquilo que eu sinto. Não gosto que me julguem, bem ou mal. Fujo a encontros. Sorrisos de desespero ( o que vou dizer a seguir?). Raras são as pessoas com que me queira encontrar. A essas, se as vir, abraço-as. Desabafos e queixas é que me põem fora de mim. Tudo me parecem trivialidades. Dou por mim a dizer as mesmas futilidades e deixo me ir pelo beco lamacento. Ultimamente tudo me irrita e ao mesmo tempo padeço de uma paciência descomunal. Atingi os limites. Nada mais espero de novo. Resta-me esperar o que falta a vida trazer, já que eu já fiz tudo para trazer a vida para junto de mim.


Nada do que escrevo é real e ao mesmo tempo torna-se real quando o leio. Parece que a escrita me antecede. Falta-lhe a voz da razão e do pensamento. falta-lhe a coerência e algum sentido. Sentido. Falta sentido na minha vida. Um rumo. Um objectivo. Falta conseguir escrever.

2 comentários:

tulisses disse...

se oq uye falta é conseguires escrever, deixa que te diga que não te falta nada, já que escreves muito bem. gostei muito, mas não tenho capacidade de comentário. mas algumas coisas infelizmente se me aplicam... bjs

Milai disse...

a tua infelicidade parece-me que tem que ver com a falta de rumo que a tua vida toma, daí compreenderes as minhas palavras. Espero que não. A única coisa que se pode aplicar a ti nestas palavras é o abraço:)